segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

A catástrofe na Indonésia poderia ter sido prevista?


A morte de cerca de 300 mil pessoas, grande quantidade de desabrigadas, assim como danos materiais não contabilizados, foram conseqüências da ocorrência de tsunamis no Sudeste Asiático. Como processos naturalmente subseqüentes a maremotos (deslocamentos por terremotos no fundo do mar), as tsunamis são fenômenos conhecidos há muito tempo nas áreas de instabilidade diretamente relacionadas aos limites das placas tectônicas que compõem a porção superficial do nosso planeta Terra. Os estudos geológicos conhecem, contabilizam e mapeiam estas zonas de ocorrência de terremotos nos continentes, maremotos nos fundos oceânicos, bem como vulcões e outros processos naturais associados, muitos deles podendo desencadear catástrofes.

Na atualidade, estas zonas de ‘periculosidade’ são todas conhecidas – nos livros de geografia para o ensino básico constam mapas das placas tectônicas, suas bordas e os processos que aí podem ocorrer. Não há desconhecimento destes fenômenos, mas uma falta de divulgação em algumas áreas sujeitas ao risco. Na atualidade, sabemos que podem acontecer em locais determinados mas numa escala de tempo indeterminável, em intervalos de tempo irregulares, geralmente não previsíveis. Ou seja, sabemos onde vão acontecer, mas não necessariamente quando.

Vale a pena chamar atenção ao fato da baixíssima mortalidade de animais selvagens nas regiões devastadas. O noticiário divulgou que guardas florestais do Sri Lanka não encontraram animais mortos, ao contrário, foi observada “uma abundante fauna de elefantes, búfalos e cervos”, indicando a possibilidade de o instinto ter sido suficiente para que eles procurassem abrigo em áreas elevadas. Portanto, a intuição milenar gravada na memória destes animais informou-os antecipadamente do perigo.

Por outro lado, a ocupação humana das áreas litorâneas no sudeste asiático é processo recente, intensificado nas últimas três a quatro décadas. Segundo Jeff McNeely, cientista chefe da World Conservation Union (IUCN) baseada na Suíça, que viveu por diversos anos na Indonésia e na Tailândia, dois dos países atingidos pela calamidade, “o que fez disto um desastre foi o fato de que as pessoas começaram a ocupar parte da paisagem que não deveriam ter ocupado". Ele contou à agência de notícias AFP: "Há cinqüenta anos atrás, a costa não era densamente ocupada como agora por hotéis turísticos." E este uso deu-se à custa de diversos processos de degradação ambiental. "O que também aconteceu ao longo das últimas décadas é que muitos mangues foram destruídos para instalar criações de camarão, de maneira que na Europa atualmente temos camarão barato," ele acrescentou. O cientista ainda refere a destruição dos recifes de coral que também providenciam proteção à costa. E explica: "Quando uma tsunami chega, ela primeiro bate no recife de coral e diminui sua velocidade, depois atinge os mangues que também a diminuem. As ondas podem ultrapassar, mas então boa parte da energia já foi dissipada."
Os seres vivos destas zonas costeiras estão acostumados a tufões, tempestades e fenômenos deste tipo. Mas, ao contrário dos animais que contam com seu instinto, os seres humanos não ‘guardam’ as precauções necessárias, não utilizam nem divulgam as informações das bases tecnológicas situadas no vizinho Pacífico, onde fenômenos deste tipo são muito bem monitorados e existem sistemas de alarme eficientes.

A população local parece desconhecer o perigo, inclusive com governantes afirmando à imprensa que “nunca aconteceu antes”. Assim, não existem sistemas de precaução. Até há relatos de turistas que, por não terem conhecimento algum sobre o perigo, são atraídos pelo baixio causado pelo recuo das águas antes da ‘grande onda’, acham que algo interessante está ocorrendo para deixar o leito da praia exposto e peixes pulando no seco, não se dando conta que têm apenas poucos minutos para fugirem para um lugar elevado.

Portanto, mais uma vez estamos diante de uma catástrofe que poderia, como tantas outras, ter seus danos reduzidos. As alterações das condições naturais de adaptações dos ambientes e dos seres vivos aos processos geológicos a que estão sujeitos, foram deliberadas sem levar em conta as conseqüências em longo prazo, ou seja, as decisões foram tomadas sem prever o planejamento técnico ambientalmente embasado.

Assim, três foram os fatores fundamentais, todos previsíveis. Um processo que é natural e conhecido, mas que teve conseqüências intensificadas por dois fatores humanos: a deterioração ambiental pelo uso indiscriminado da paisagem e a ausência de estrutura de sistema de alerta como existe em regiões mais desenvolvidas.

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